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segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Violência no trânsito: por que somos tão selvagens?

Há decadas atrás, os horários de pico no trânsito eram definidos por uma palavra inglesa que significa pressa e agitação: rush. Com o passar dos anos, o tempo gasto em deslocamentos em grandes cidades aumentou muito. Em São Paulo, por exemplo, motoristas perdem cerca de 2 horas e 40 minutos diários dirigindo num ritmo de tartaruga. É um teste de paciência que poucos tiram de letra e com bom humor: as pessoas estão cada vez mais desumanas no trânsito - e é difícil fugir dessa realidade.
O incrível é que esse comportamento foi anunciado há tempos. Em 1950, quando o Brasil somava 426 mil veículos (hoje somente a capital paulista conta 7 milhões), a Walt Disney Company lançou o curta-metragem Motor Mania que mostrava como o boapraça Pateta se transformava em um "monstrorista" ao girar da ignição de seu carro (para assistir ao filme, digite "Pateta no Trânsito", no YouTube).
Motoristas na defensiva
A eficiência da fiscalização e punição dos infratores também influenciam no comportamento dos motoristas ao volante. Se na Suíça, por exemplo, condutores param diante da faixa de pedestre, mesmo que vazias, em países megapopulosos como a Índia a situação é completamente inversa. Em Nova Délhi, a quinta cidade com o trânsito mais desgastante do mundo (seguida por São Paulo), dirigir significa dividir espaço com pedestres, bicicletas, vacas, cachorros, elefantes e cavalos.
No livro Por Que Dirigimos Assim?, o jornalista norte-americano Tom Vanderbilt cita uma explicação do ex-líder de policiamento de trânsito de Nova Délhi sobre o caos nas ruas: "A presença de uma vaca (animal sagrado para a cultura hindu) em uma área urbana
congestionada não representa um perigo (...), também força o motorista a desacelerar". Talvez o respeiro por estes animais explique a falta de agressividade vista nas pistas do país.
Aqui no Brasil, a situação não é bem essa. Muitas vezes, uma discussão mais acalorada entre condutores termina em violência. Por que isso acontece? Em cidades estressantes como São Paulo, muitos motoristas saem de casa já prontos para atacar e se defender.
Selva no asfalto
O resultado é um só: falta de educação e mau comportamento nas vias. Motoristas que fecham cruzamentos, que jogam farol alto no carro da frente porque ele está devagar, que aceleram tão logo o semáforo abre forçando a barra para o pedestre atravessar correndo.
Não dá mais para cada pessoa achar que está sozinha na rua. Também não podemos fechar os olhos para realidades tão simples como o espaço que os ciclistas vêm conquistando. Eles existem e passar com o carro por cima deles não é solução. O problema é que, dentro de seus carros, os motoristas não se encaram como iguais. O trânsito é um ambiente em que as pessoas não somente demonstram sua irritação com um congestionamento, mas também se aproveitam (inconscientemente) para descarregar suas frustrações.
Existe saída?
Mas não podemos simplesmente aceitar essa situação. Fiscalizar e punir motoristas infratores não é suficiente. Não é a lei que ensina às pessoas valores de cordialidade e de respeito aos outros. É com a família que aprendemos a ser educados, e nosso comportamento como motoristas é um espelho da forma como nossos pais dirigem.
No livro Fé em Deus e Pé na Tábua, o sociólogo Roberto DaMatta aponta o individualismo sobre rodas como um grande problema do trânsito. "Trata-se de ensinar que o sujeito ao lado existe como cidadão. Que ele, por ser desconhecido, não pode ser tratado como um inferior ou um débil mental". A mensagem de DaMatta é que devemos olhar ao redor e observar.
Segundo Leon James, professor de psicologia da Universidade do Havaí, a condução colaborativa é uma boa medida para melhorar o convívio nas ruas. Para o professor, mudar o comportamento no trânsito depende de três passos. Primeiro, o motorista precisa reconhecer sua atitude ao volante e se dispôr a tornar-se um cidadão melhor; depois, precisa perceber seus sentimentos agressivos na direção; e, por último, modificar essas emoções ao dirigir.
Quem sabe a princípio pareça meio boboca dar passagem ou não ultrapassar o carro que está mais lento, mas, com o tempo, vai que a gentileza pega de vez. Pode até parecer uma ideia zen demais, mas certamente é uma das saídas para o caos no trânsito.

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